Quando se trabalha em um banco público, há de se saber o nosso papel. Como esta foi uma bandeira que eu sempre empunhei, vou compartilhar este belo texto de uma colega, sobre a ação de outra colega:
O belo e sensível texto abaixo é de Lígia Folda! Me emocionou.
A colega Luanna é um exemplo de como devemos nos portar, não só como empregados da Caixa, mas como pessoas!
A colega Luanna é um exemplo de como devemos nos portar, não só como empregados da Caixa, mas como pessoas!
Visita ao Banco, porque em tempos de ataque aos trabalhadores, nosso salário encolhe a olhos vistos. Socorro-me na Caixa Econômica Federal, banco público. Sou defensora dos serviços públicos. Permaneço fiel. Sei que a CEF está sob ataque, para que os serviços sejam piores que dos bancos privados e se convença a população de uma suposta incompetência de seus funcionários e de que a melhor saída seria a privatização. Continuo resistindo.
Pois hoje fui à agência da CEF, em Guaratuba.
Subo ao segundo andar e sento em meio aos clientes, aguardando a vez. A bancária, jovem, sentada firme, coluna ereta e olhar seguro, repete o número da senha. Ao meu lado, levanta-se um homem. Impossível adivinhar-lhe a idade e a etnia: pescador, muitos anos exposto ao sol e ao sal do mar, sua pela é uma crosta negra, sulcada horizontal e verticalmente. As mãos são quase grotescas, na misteriosa mistura de nós e cortes. Levanta-se, parcialmente. A coluna vergada, como um mastro demasiadamente castigado pelo vento sul. Caminha, com uma timidez que quase inviabiliza cada passo, em direção àquela cadeira azul, diferente, com certeza, de qualquer móvel que ele possa ter em sua choupana de família pescadora.
Observo o choque entre os dois mundos. A bancária, jovem e firme, dobra-se instintivamente na sua cadeira, até ficar alguns milímetros abaixo dos olhos do pescador e, com clara espontaneidade, indica-lhe a cadeira como quem pedisse a um ilustre visitante que lhe desse a honra de dividir com ela uma xícara de chá.
O visitante se senta, incomodado. Ainda mais encurvado. Ela curva mais um pouco. Ele começa a falar, quase inaudível. Parece-me ver, na moça, o arco da concha auditiva se ampliar para acolher aquela voz que teme a vergonha de sair. Ela ouve. Depois, ela fala, bem audível para que os ouvidos dele não sofram a vergonha de não ouvir e ter de perguntar novamente. Ele não pergunta nada. Mesmo assim, ela explica. Re-explica. Explica mais uma vez. E o pescador vai assumindo o domínio daquela relação com o banco. Atividade que é uma ínfima parcela do movimento geral do dinheiro, mas ainda assim estranha, confusa, do intencionalmente estranho e confuso universo financeiro. À medida que conhece, e sabe o que vai acontecer e como, e como pode e deve agir, o homem vai desembaraçando uma corda que ligava o pescoço aos joelhos. Levanta aos poucos a coluna. A moça o acompanha, um grau abaixo e sempre um segundo depois dele.
Tudo acertado, entre eles, aproxima-se o gran finale. Ela aguarda a iniciativa dele. Ele levanta, já bem postado nas duas pernas, “coluna ereta e coração tranquilo” – ao menos naquela situação. Ela levanta, firme e segura como antes de recebê-lo. Ambos iluminados pela magia de uma igualdade de tratamento, em um mundo de desigualdade material. Ela estende a mão e ele retribui. Apertam-nas com firmeza. Meu coração se aperta em doçuras, como se estivesse espremido no meio daquelas mãos.
Não sei o nome do pescador. Não consegui falar com ele. Mas a jovem bancária é a Luanna Silvano Campeli, da CEF de Guaratuba.
Pois hoje fui à agência da CEF, em Guaratuba.
Subo ao segundo andar e sento em meio aos clientes, aguardando a vez. A bancária, jovem, sentada firme, coluna ereta e olhar seguro, repete o número da senha. Ao meu lado, levanta-se um homem. Impossível adivinhar-lhe a idade e a etnia: pescador, muitos anos exposto ao sol e ao sal do mar, sua pela é uma crosta negra, sulcada horizontal e verticalmente. As mãos são quase grotescas, na misteriosa mistura de nós e cortes. Levanta-se, parcialmente. A coluna vergada, como um mastro demasiadamente castigado pelo vento sul. Caminha, com uma timidez que quase inviabiliza cada passo, em direção àquela cadeira azul, diferente, com certeza, de qualquer móvel que ele possa ter em sua choupana de família pescadora.
Observo o choque entre os dois mundos. A bancária, jovem e firme, dobra-se instintivamente na sua cadeira, até ficar alguns milímetros abaixo dos olhos do pescador e, com clara espontaneidade, indica-lhe a cadeira como quem pedisse a um ilustre visitante que lhe desse a honra de dividir com ela uma xícara de chá.
O visitante se senta, incomodado. Ainda mais encurvado. Ela curva mais um pouco. Ele começa a falar, quase inaudível. Parece-me ver, na moça, o arco da concha auditiva se ampliar para acolher aquela voz que teme a vergonha de sair. Ela ouve. Depois, ela fala, bem audível para que os ouvidos dele não sofram a vergonha de não ouvir e ter de perguntar novamente. Ele não pergunta nada. Mesmo assim, ela explica. Re-explica. Explica mais uma vez. E o pescador vai assumindo o domínio daquela relação com o banco. Atividade que é uma ínfima parcela do movimento geral do dinheiro, mas ainda assim estranha, confusa, do intencionalmente estranho e confuso universo financeiro. À medida que conhece, e sabe o que vai acontecer e como, e como pode e deve agir, o homem vai desembaraçando uma corda que ligava o pescoço aos joelhos. Levanta aos poucos a coluna. A moça o acompanha, um grau abaixo e sempre um segundo depois dele.
Tudo acertado, entre eles, aproxima-se o gran finale. Ela aguarda a iniciativa dele. Ele levanta, já bem postado nas duas pernas, “coluna ereta e coração tranquilo” – ao menos naquela situação. Ela levanta, firme e segura como antes de recebê-lo. Ambos iluminados pela magia de uma igualdade de tratamento, em um mundo de desigualdade material. Ela estende a mão e ele retribui. Apertam-nas com firmeza. Meu coração se aperta em doçuras, como se estivesse espremido no meio daquelas mãos.
Não sei o nome do pescador. Não consegui falar com ele. Mas a jovem bancária é a Luanna Silvano Campeli, da CEF de Guaratuba.
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